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O Corsário e a Ciência

Textos de divulgação científica e reflexões sobre Ecologia da Saúde, à luz da teoria evolutiva ultradarwinista:

O Corsário e a Ciência

Textos de divulgação científica e reflexões sobre Ecologia da Saúde, à luz da teoria evolutiva ultradarwinista:

10.03.11

O medo e o crime coletivo da morte de até 510 árvores do Parque Municipal de BH


Sérvio Pontes Ribeiro

Quem passa na frente do Parque Municipal de Belo Horizonte hoje nota as gigantescas clareiras já abertas, com a morte provocada de árvores centenárias, que em qualquer país desenvolvido seriam tombadas por lei, amparadas por cabos de aço, podadas até seu encolhimento, e morte natural.

 

Cabe aqui lembrar que a árvore mais velha do mundo tem apenas 14 metros de altura? Cabe! Cabe lembrar que é bem conhecido pela ciência que árvores maduras envelhecem encolhendo, sofrendo embolias (quebra na transmissão da água pelo xilema, causando morte do ramo)? Cabe lembrar que dava para encolhê-las, moldá-las. Protegê-las!

 

Cabe então pensar o óbvio!!! Porque diabos em cidades brasileiras árvores velhas são vistas como um risco à vida e ao patrimônio? Falta controle adequado, falta interesse em manejo adequado, e sobra ódio às árvores!

 

Isto mesmo, o cidadão urbano, inteligente, estudado e culto, odeia árvores. Odeia do fundo da alma, como odeia a proximidade com a natureza. Este mesmo cidadão que faz campanha para a biodiversidade, recicla, acha lindo macaquinho, arara e baleia em campanha do WWF, chama a prefeitura para derrubar a árvore de sua porta se tem folha demais, se aparece um morcego, um gambá, ou um insetinho qualquer (faço aqui minha única defesa à Prefeitura de BH, nominalmente ao corpo técnico do Departamento de Parques e Jardins e algumas Regionais que não cedem e não derrubam árvores à toa).

 

Falo repleto de revolta, pois hoje estou revoltado com a mediocridade social. E estou revoltado com tantas árvores espetaculares condenadas depois que uma, UMA árvore, após mais de 100 anos de serviço prestado dentro de uma floresta urbana fantástica, cai e mata uma senhora (por sinal, amante das árvores). Estudo feito em... UM SEMANA! anunciou a imprensa, levará a morte de 14 % do Parque! Detalhe, os 14% das árvores mais frondosas, portanto, uma parcela muito maior do sombreamento e do volume fotossintético do parque - um serviço ambiental fundamental contra o aquecimento global!

 

SÃO 325 CONFIRMADAS, PODENDO CHEGAR A 510 ÁRVORES ANTIGAS CONDENADAS!

 

Impressionante burrice, feita por quem tinha que estar elaborando planos de neutralização de Carbono urbano. Engraçado que carro atropela mais de 100 por dia neste país, e ninguém nunca propôs suprimir 14 % dos carros que circulam.

 

Estonteante burrice. Não do poder público, mas do coletivo, que aprovou a medida sem em nada refletir. Mergulhados em burrice, vamos levando o mundo ao colapso, de árvore em árvore, nesta e em outras escalas.

 

Afinal, todo mundo tem uma boa razão para que a sua árvore morra, seu antibiótico seja jogado na pia, seu metal pesado das pilhas e computadores no lixo, seu gasto energético exorbitante seja feito... alguns bilhões de motivos para crer na nossa extinção inevitável, e infelizmente, muito sofrida.

 

Então vejamos o medo. Temos mais medo da falta de acesso que dos carros que atropelam? Temos mais medo da natureza por perto, doenças tropicais, cupins do que do aquecimento global (claro, pois não lembramos tanto dele quando nos enche a rua a inundação, que por sinal ocorre por excesso de pavimentação e falta de arborização)?

 

Temos um medo tão ignorante das árvores que nos tampa o óbvio. Senão vejamos. Se um jornal televisivo denunciar hoje um agricultor que deseja derrubar 510 árvores de Mata Atlântica para plantar comida, iremos ou não protestar? De cara vamos protestar, pois é fato criado para tal. Ninguém vai se perguntar se o cidadão tem mais 3000 árvores em reserva permanente, se houve estudo para aquilo etc. Não. Condenação ao delatado, pois a massa burra, nós, só servimos para concordar com os fatos marrons jogados na nossa cara.

 

Estranho que se o mesmo jornal anunciasse que uma Prefeitura concluiu em estudo que deve-se tirar 510 ÁRVORES antigas de um Parque Municipal tombado, em uma região deficiente de arborização, no centro infernalmente quente de uma capital brasileira, está tudo bem. Mais do que bem, nos sentimos seguros e protegidos.

 

Que lástima, que triste “Matrix” já vivemos nela. Quando formos extintos, sobrará dizer:  merecemos, pois somos burros demais para a seleção natural nos deixar por aí!