03.10.10
O mundo com Marina e os brasileiros
Sérvio Pontes Ribeiro
Várias trabalhos pendentes mas é preciso parar. Uma eleição Presidencial no país da maior megabiodiversidade do planeta, as maiores fronteiras agrícolas e os piores líderes no setor produtivo quanto à sustentabilidade. Um desenvolvimento à base do minério e da agro-indústria, e a chance de uma população ser o fiel da balança da sobrevivência da espécie humana na Terra. Para mim, é sério deste tanto, e se desenrolou, hoje.
E foi na mais profunda euforia que vi fecharem a apuração e a maior rede televisiva do país e outras abrirem online a entrevista não do primeiro, não do segundo, mas do terceiro lugar, Marina Silva, candidata do PV. Cresci amedrontado pela Ditadura militar e pala ignorância instalada na população. Nada parecia mudar. De fato, levou três vezes mais tempo para o Brasil entender a revolução pacífica e social que precisava ser feita e que Lula fez, do que para entender que esta revolução terá que ser seguida por outra, sócio-ambiental, onde toda a diferença do mundo está, literalmente, em como vamos crescer nos anos que virão.
Hoje, Marina teve quase 20 milhões de votos, e 19,7% do eleitorado, e é quem vai decidir, sozinha, quem será o próximo Presidente do Brasil. Demos, com uma legitimidade nunca vista, a ela, este pressuposto. Vencemos o medo do retrocesso e não votamos para forçar a melhor opção (que certamente não é o regresso ao neoliberalismo PSDBista). Ao contrário, forçamos qualquer uma das opções a abandonar a arrogância, a soberba desenvolvimentista e negociar nossa sobrevivência e diversificação cultural, micro-econômica, e ambiental.
Hoje venceu a gentileza, a beleza, a serenidade humana e doce de Marina. Hoje venceu tudo que precisamos ser, e ter à nossa frente. Mais que o diálogo, a aceitação, o respeito e a decência política que todos, até Lula, foram perdendo pelo caminho.
E hoje venci o medo que tive quando voltei para o Brasil. Se não bastasse ser parte de uma geração perdida, com enormes falhas educacionais, científicas, tecnológicas e políticas, temia o que me rodeava. O medo de viver espremido entre a geração fracassada que perdeu para a ditadura e que se vendeu pela conformidade da proteção hipócrita da classe média, gerando o país mais injusto do mundo, por um lado. Pelo outro, pela próxima geração que eu julguei individualista e superficial, portanto, tão perdida quanto a minha! Ao menos quanto a esta, tudo indica, me enganei, ou ao menos, deixem-me crer nisto por um tempo. Talvez uma pequena faixa tenha mesmo se perdido. Porém, me parece mesmo que o paradoxal “introspectar” na internet transformou-se no prazer de se expressar com uma liberdade que as regras arcaicas da nossa sociedade provinciana nunca permitiriam. E vocês todos com menos de 30 anos se manifestam poderosos e me enchem de esperança como nunca tive na vida quanto à política deste país.
Hoje me comovi ainda mais do que me comovi quando Lula virou Presidente pela primeira vez. E quem tem mais que 30 anos, sabe muito bem o que isto significa. O PV, um partido global, e a Marina são ícones internacionais, e hoje demos outro recado, ao mundo. Contamos que há um Brasil se opondo a outro, e que luta junto ao resto do mundo pela Amazônia (veja que o PC do B das mudanças do código florestal, e outras forças reacionárias, ganharam e muito em todo território amazônico e do cerrado, na busca sangrenta por não terem freios e converterem todo o resto da biodiversidade em seu velho modelo de enriquecimento elitista e irresponsável, ou de populismo vazio). Com todas dificuldades e atrasos que não acabaram, hoje contamos ao mundo que esta biodiversidade é nossa sim, e que vamos tentar sim salvar o mundo dos piores cenários possíveis, aos quais ainda estamos expostos. Hoje, quase 20 milhões de pessoas contaram que não vai ser fácil roubar o nosso futuro.