06.10.16
A curiango e o gavião na jardineira
Sérvio Pontes Ribeiro
Um pequeno drama da vida selvagem na minha janela. Vários sabiás fazendo o que chamamos de “mobbing” (mais ou menos, bagunça) entorno de um gavião que acabara de destruir o ninho de curiango da minha jardineira. Isto mesmo. Bem dentro de BH, dois predadores primários (sabiás e curiangos, insetívoros) contra um predador de topo. Para um biólogo que estuda saúde ecossistêmica, isto equivale a olhar uma pele saudável de uma pessoa esbelta! Reflete que ao menos a parte da cidade onde eu moro, está bem.
Deveria estar satisfeito, mas tinha acabado de ver um pequeno curta sobre o acidente da Samarco, e quando meus olhos voltaram da distante árvore onde o gavião foi buscar sossego, viu o telhado de meu vizinho, um francês, geólogo da mineração. Será ele responsável pelo acidente em Barcarena, com aquela mineradora francesa que destruiu as águas amazônicas naquela região, sem alarde, sem drama e com uma pequena multa? Barcarena, o maior PIB do Brasil, uma das populações ribeirinhas mais miseráveis da Amazônia, cujo único benefício minerário foi o de sempre: prostituição para as filhas e violência para os filhos.
Mas fiquei pensando no nosso recente desastre ambiental no Rio Doce, e no sistema falido, entrópico, que destrói para construir. Este sistema terá que acabar, ele é o causador de TODO o racismo ambiental do mundo. No entanto, além e antes disto, é preciso melhorar e preservar a qualidade ambiental de onde está bem. A saúde florestal de uma cidade depende de suas árvores, e seu manejo com menos inseticidas e mais predadores naturais. Depende de reconhecimento da importância da fauna nativa dentro da cidade. Depende de um forte saneamento básico combinado com controle de zoonoses de animais domésticos, que não deve ser confundido com defaunamento silvestre urbano. Depende de voltarmos a viver como parte de um ecossistema. Até entendermos que temos que consolidar ecossistemas antrópicos sem destruir outros, temos que ser cautelosos com as poucas chances que nos restam.